Book Influencers e sexo
Ali na estante diante de mim, está o meu exemplar do romance O Leitor, de Bernhard Schlink, obra muito conhecida, sobretudo graças ao filme que a partir dele se fez. O meu livro tem as folhas amarelecidas, é de 1998, publicado pela desaparecida editora ASA.
Lembro-me de, no final da leitura, comentar como tinha gostado, e como, ao fim de tanta literatura lida, um romance ainda podia surpreender-me tão fortemente.
Há dias, li o parecer duma book influencer no Instagram (3 mil e tal seguidores), em que considera que o livro tem algo de muito problemático – um miúdo de 15 anos tem uma relação com uma mulher de 36 (na Alemanha do pós-guerra). A influencer vai por ali afora, sempre batendo na mesma tecla, embora pelo meio faça algumas outras interpretações abstrusas, e termina insistindo que uma relação entre uma criança de 15 anos e uma adulta de 36 é claramente problemática “para dizer o mínimo”.
Ora eu, para dizer o mínimo, pergunto quem é que, em 2023, e sexualmente falando, entende um rapaz de 15 anos como uma criança (subrepticiamente seduzido, subentende-se)
E antes de 2023, por toda a história da humanidade, sexo com um rapaz de 15 anos alguma vez foi considerado desvio de menores? Não me lembro!
Porém, a crescente infantilização da nossa sociedade, em que se vai ao pediatra até aos 18 anos e se fica em casa dos pais até bem depois dos 30, leva a que as delicadas e moralistas cabeças das nossas influencers se possam atormentar com o sexo consensual entre uma mulher madura e um adolescente, num romance que se passa na década de 1950.
Curioso é que essas cabeças dizem que leem muitíssimos livros, e a mim parece-me que nem eles estão a conseguir fazer o milagre de as abrir e arejar.
Se não eles, quem?