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Última Paragem

O blog do bicho do mato

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Última Paragem

01
Mai24

Paul Auster 1947-2024

Maria J. Lourinho

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Nos anos 1990, comecei por ler um mini-livro que se chamava O Caderno Vermelho.

Meia  dúzia (nem tanto, talvez) de acontecimentos casuais. Começou aí a minha "febre" Paul Auster. Acho que li tudo o que estava publicado, e o que continuou a ser publicado, com verdadeira devoção.

Paul Auster era o escritor do acaso, narrado em sucessivas histórias de cadência narrativa pior que cola-tudo; era-me impossível largar o livro e a história.

Devo-lhe muitas horas de puro prazer literário.

Morreu ontem, de cancro, aos 77 anos.

Obrigada, Paul.

05
Fev24

A montanha Fosse

Maria J. Lourinho

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Jon Fosse foi Nobel da Literatura no ano passado. É norueguês.

São 300 páginas de uma toada sobre a vida, o passar da vida, o mar, o fiorde, o frio, a neve, a solidão, o alcoolismo, a arte, o amor, a amizade, as lutas individuais, Deus, a morte.

A toada às vezes é bela, ás vezes é mística, quase sempre é melancólica, e muitas vezes é chata de tão repetitiva.

É preciso ter paciência, sim, e não foi fácil a leitura. 

Dentro dela, eu própria me senti, frequentemente, às voltas no fiorde, sobre a neve e com frio.

No fim, não fiquei convencida de ter lido um livro inesquecível, mas ficou a satisfação de ter chegado ao fim, ainda que muito cansada e com falta de oxigénio, como se tivesse conseguido escalar uma enorme montanha. Nevada, é claro.

19
Dez23

Inveja

Maria J. Lourinho

Fotografia0191.jpg

A foto é minha mas pode levar

...Estava um dia de Janeiro luminoso, o sol brilhava nas árvores de folha perene, o ar era límpido como um sino; era uma luz de último grito, como às vezes ocorre num meio-dia de Janeiro; não uma luz intensa , mas pálida e purificante como sumo de limão.

Lorrie Moore, Uma Porta nas Escadas

Ai o que eu gostava de ter escrito isto!!!

 

12
Dez23

Uma Porta nas Escadas

Maria J. Lourinho

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Há muito que procurava este livro, que estava sempre “não disponível”. Até agora.

Maravilhosamente bem escrito, conta-nos sobre um ano de vida de uma rapariga americana, oriunda de um meio rural, que vai para a cidade (Troy no Michigan) frequentar a universidade, cerca de um ano depois do 11 de Setembro.

Nessa sua passagem para a idade adulta, apetece perguntar quantas perdas se podem suportar em pouco tempo.

Não há finais claros para as relações emocionais que ela vai estabelecendo; não sabemos o que acontece a quem entra, e depois sai, da vida de Tassie Keltjin. Pode ser um pouco frustrante, não estamos habituados a isso na literatura, mas não é o que acontece também tantas vezes nas nossas vidas?

Na escrita de Lorrie Moore, as descrições de fauna e flora, que tantas vezes me parecem pouco entusiasmantes, se não mesmo chatas, são coloridas, vibrantes e até aromáticas.

O humor (às vezes negro), insinua-se,  é subtil, e a América está lá toda:pobres e ricos, racismo, terrorismo, guerra do Afeganistão, e estranhas formas de amar e cuidar, mas também oportunidades em aberto.

A prosa é magistral.

Não me arrependo da espera pelo livro. Ao contrário.

O livro é de 2009, nas Edições Relógio d'Água e de 2010.

04
Jul23

Interrogação minha mas de que nunca me tinha lembrado

Maria J. Lourinho

É para isso que (também) servem livros e escritores - para nos dizerem e interrogarem sobre nós mesmos.

"Como será que estamos presentes na existência dos outros, na sua memória, na sua maneira de ser, mesmo nos seus actos?"

Annie Ernaux em Memória de Raparig

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A descrição dos seus anos de passagem, de que se ocupa esta obra, vividos dez anos antes de Maio 68, e, portanto, da queda de todos os interditos, sobretudo os sexuais, é de um desassombro tão completo e corajoso que pode, em algum momento, trazer desconforto ao leitor, de tal modo nos sentimos a espreitar pelo buraco da fechadura, e a entrar em locais para onde, geralmente, não somos convidados – não tanto no corpo da rapariga, mas sobretudo na sua alma.

Crescer nunca foi fácil, muito menos para as mulheres no final dos anos 1950 e princípio dos de 1960; por isso lê-lo incomoda, mas a escrita delicia.

E cito a citação que Annie Ernaux faz de Nitetzsche que, por fim, tudo resume:

- Temos a Arte para não morrermos de Verdade.

 

09
Fev23

Abençoada zaragata

Maria J. Lourinho

Já aqui falei do podcast da Antena 1, Biblioteca Pública, que existiu durante todo o ano de 2022. Continuo a ouvir, durante as minhas caminhadas, Dulce Maria Cardoso, Afonso Reis Cabral e Richard Zimmler, a falar sobre cada livro escolhido semanalmente.

Há dias, escolhi para ouvir o episódio sobre uma novela de Tolstói - A Sonata de Kreutzer, que nunca tinha lido. Sabia apenas que era, a par de A Morte de Ivan Ilich, uma das suas novelas mais conhecidas, e que era bastante controversa.

No podcast, gerou-se, entre os três participantes, uma civilizadíssima zaragata, deixando-me ficar claro como a obra era, de facto, controversa, e possível de variadas leituras.

Decidi, então, que era tempo de ler a Sonata de Kreutzer. Descarreguei-a em pdf  para o meu computador por zero euros, li-a, e fiz a minha própria interpretação, que também não coincide exactamente com nenhuma das outras três.

Por fim, resolvi ouvir a sonata de Beethoven. Fui ao Youtube, escolhi  uma versão mais ou menos ao acaso e ouvi.

Admirável mundo novo: cheio de perigos, ameaças e desencantos mas que, ao mesmo tempo, me permite ouvir gente inteligente a analisar uma obra literária, lê-la, e ainda ouvir a música que lhe dá o nome. 

Tudo sem precisar de sair de casa nem de abrir a carteira.

03
Jul21

Tudo o que Conta, James Salter

Maria J. Lourinho

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Quando todos os críticos resolvem pôr-se de acordo sobre um livro ou um autor, eu, que não me acho esperta como a maioria dos meus compatriotas, confio, e vou a correr procurar o livro para matar a incontrolável curiosidade que me toma conta da cabeça.

Foi o que aconteceu com o livro Tudo o que Conta, do escritor norte-americano James Salter.

Não serei esperta mas também não sou mentirosa. Se o fosse, faria coro, tecendo loas à prosa do escritor já falecido, que sempre teve poucos leitores, dizem, mas que, dizem também, parece ser “o suprassumo do suco da barbatana”.

Pois, como não sou mentirosa, direi apenas que o romance se me afigurou banal, muito autobiográfico, dizem, mas sem rasgos introspectivos, masculino até ao tutano, duma masculinidade hoje quase insuportável.

O herói do romance vai de mulher em mulher, confundindo sempre êxtase sexual com amor.

As descrições das suas amante são sobretudo físicas e das indumentárias por elas usadas, mas do que elas são, realmente, ficamos a saber pouco.

Na penúltima página, Salter escreve referindo-se ao seu personagem principal:

“Nessa tarde tinha andado a arrancar ervas daninhas no jardim e, ao baixar os olhos, tinha visto abaixo dos calções de ténis um par de pernas que lhe pareceram de um homem mais velho. Tinha de se lembrar de de não andar por casa assim em calções quando Ann lá estava, provavelmente nem mesmo vestir o quimono de algodão que mal lhe chegava aos joelhos, nem andar em camisola interior. Precisava de ter cuidado com essas coisas”.

É o reconhecimento da velhice a chegar, e é então que resolve levar Ann a realizar o sonho de visitar Veneza, dando assim ao leitor a ideia de que vai assentar.

De homens como Bowman eu costumo dizer que chegaram ao momento em que percebem que vão precisar é de uma enfermeira, e então, “assentam”.

Gostei de o conhecer, senhor Salter (gosto sempre de conhecer), mas o nosso relacionamento, se calhar, fica por aqui.

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