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Última Paragem

O blog do bicho do mato

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Última Paragem

06
Set24

Fisicalidade

Maria J. Lourinho

original.webpHá meia dúzia de anos, deixei de comprar o Expresso e passei a lê-lo online através de uma assinatura.

Ontem, li que o jornal tem um novo formato, ligeiramente diferente, e trazia um novo caderno - Ideias.

De repente, bateu-me uma enorme vontade de voltar a ver o jornal em papel, e comprei-o.

Foi como aqueles jantares de comemoração de 5 anos do fim do curso - ai que saudades tinha de te ver, o que fazes?, estás na mesma!!!

Estava eu a interrogar-me de onde viria toda esta parvoíce, quando no tal novo caderno - Ideias - a  escritora Isabela Figueiredo escreve a propósito dos supostos encontros tipo Tinder nos supermercados Mercadona:

"A fisicalidade, o medo e o risco fazem parte do jogo de sedução e das emoções que lhe dão sentido. O que subjaz a tudo isto é uma enorme vontade de regressar ao lado menos domesticado das relações, quase desaparecido na contemporaneidade politicamente correta. Onde há muita civilização há muita frustração. Queremos o velho romance cara a cara que entrou em desuso com a internet. Sonhamos com a presença do outro. Estamos fartos de nudes por WhatsApp."

A minha relação com o Expresso é meramente pragmática, mas isso não quer dizer que, de quando em vez, não ganhe com um pouco de fisicalidade também.

Foi bom, mas agora...adeus.

Nota: vou guardar este jornal como um bem valioso. Já muitas vezes tinha pensado que nesta casa não havia uma única folha de jornal, e todos sabemos como elas às vezes dão jeito...!

29
Ago24

Olha eu

Maria J. Lourinho

"Nas mais variadas ocasiões (algumas divertidas), as pessoas esquecem-se de mim, não estão bem a ver quem sou, têm uma ideia vaga, não gostam nem desgostam, conhecemo-nos mas é como se nunca nos tivéssemos conhecido, evoco episódios que não recordam, converso sobre casos que vivemos juntos sem despertar qualquer reacção, amigos esclarecem que somos apenas conhecidos, namoradas lembram-se de mim como um vizinho que encontram no elevador ao fim-de-semana, primos em primeiro grau tratam-me como primo em oitavo, vizinhos não respondem ao cumprimento, lojistas não me atendem porque não deram por mim, e uma vez num café, é certo que em Paris, levantei umas vinte vezes o braço e saí sem ser atendido."

Pedro Mexia

Expresso, Agosto 2024

Tal e qual 

12
Jan24

Verdade com mas

Maria J. Lourinho

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É verdade, sim,  mas também é uma moda.

Ainda estão no secundário, são muito infantis e dependentes da mamã, e já estão a falar em ir embora, como se isso fosse uma promoção social, ou a demonstração de pertença a um estrato social cimentado no cosmopolitismo.

Não é. 

Não estou a dizer que aqui se pagam salários justos, ou que ganhar mundo é mau, longe disso, mas às vezes, quando os oiço, parecem estar a desdenhar do país que os forma e mima, e a quem é suposto, pelo menos na minha cabeça, retribuirem alguma coisa.

E isso irrita-me um bocado, confesso.

22
Nov23

Gordura e capitalismo

Maria J. Lourinho

Luís Pedro Nunes, que no Eixo do Mal da Sic frequentemente se enrola todo no discurso, é um excelente jornalista, escreve muito bem.

As suas crónicas semanais na revista E do Expresso, trazem-nos quase sempre temas curiosos e inusuais.

Se, no Eixo do Mal, não é raro eu aproveitar o tempo de antena dele para ir lavar os dentes, as suas crónicas escritas da E raramente me escapam.

À mais recente, deu-lhe o título de "A Sociedade do Açúcar" e nela fala um pouco da história do açúcar ao longo dos séculos e de como o seu uso alterou as sociedades. E vai continuar a alterar, segundo crê, com base em novos fármacos que prometem acabar com a obesidade.

Deixo um excerto da sua crónica para aguçar o apetite (mas não de açúcar )

As faculdades “miraculosas” dos semaglutidos ou outras drogas antiobesidade terão sempre a oposição de um dos mais fortes pilares do capitalismo, assente em açúcar, mas poderosíssimo. Quando está a tomar estas drogas e/ou quando se decide por uma alimentação saudável, o consumidor não tende a diminuir a quantidade de junk food ou de calorias. Mas, sim, a eliminá-las por completo. As cenourinhas McDonald’s e a Coca-Cola Zero deixam de apetecer sequer. Esta indústria é grande demais para cair de um dia para o outro. Os números de Wall Street podem prever hecatombes nos conglomerados alimentares, mas será para fazer dinheiro rápido. Se tal acontecesse, teríamos de refazer a sociedade, indústria, distribuição, o sistema publicitário, tudo. Um mundo de magros seria uma devastação para o atual capitalismo.

28
Jun23

Raimundo tanto faz

Maria J. Lourinho

Notícia do Expresso:

"O secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, afirmou este sábado não estar preocupado com a eventual saída do primeiro-ministro português para presidir ao Conselho Europeu, mas sim com os problemas de quem vive e trabalha em Portugal."

Pensamentos meus:

1- Raimundo acha que os problemas de quem vive e trabalha em Portugal não têm nada a ver com quem governa, ou com quem é  o primeiro ministro. 

Tanto faz.

2 - A lógica é uma batata e o Raimundo pode ser...sei lá, um nabo, talvez.

3 - Pela mesma lógica, ter Raimundo ou não ter Raimundo, tanto faz.

 

17
Abr23

Carregado às costas

Maria J. Lourinho

Esta imagem é da primeira página do Expresso digital de sábado. Calhou ser do Expresso, porque todos os dias vejo isto em algum OCS.

Nas TVs, ele, o nome dele, a opinião dele, a provocação dele, são uma costante.

Este homem tem sido carregado às costas da comunicação social para o centro do palco da política portuguesa, debaixo do nosso nariz e da nossa impotência.

ventura.jpg 2.jpg

 

07
Mar23

Enfeitiçada

Maria J. Lourinho

Enfeitiçada por esta extraordinária foto publicada no Expresso de 4 Março 2023.

Na legenda lê-se: Danièle (1943-2023) na casa do Guincho, em 2011, no ano da morte de Gérard, empunhando a fotografia do marido. Na parede, a sombra do lugar onde estava a foto encaixilhada

JOSÉ M. RODRIGUES

Nota: o Gérard referido era Gérard Castello-Lopes, o fotógrafo

Danièle-Castello-Lopes.jpg

28
Jun21

Ser morno

Maria J. Lourinho

No seu artigo do Expresso desta semana, Pedro Mexia escreve um muito elogiado texto  sobre o extremar de linguagem e posições políticas, defendendo “os mornos”.

Cito:

A verdade é que, no campo político, vivemos em época de abominação dos “mornos”, tratados como cobardes, vendidos, traidores. Já aqui escrevi sobre alguns autores que nos últimos anos têm recusado a lógica de trincheira, e que receberam a consequente excomunhão ideológica

...

Fala, de seguida, de autores famosos, que foram muito criticados, como Albert Camus e a sua vontade de “não dizer coisas definitivas” ou a Hannah Arendt por “compreender que o demoníaco se pode manifestar através do entorpecimento do juízo, da máquina burocrática, do “obedecer a ordens”. 

E conclui:

...Dir-se-á que não há comparação entre estes casos e os de hoje, porque não estamos na Guerra Civil de Espanha, numa guerra mundial, numa guerra independentista ou em Guerra Fria. Mas se não estamos, se nem isso desculpa o fanatismo, porquê agora, à esquerda e à direita, a linguagem dos cobardes, dos traidores, dos vendidos, do “fazer o jogo de”, lamentável resquício de um século trágico?”

 

Ora, eu que sou admiradora do pensamento e postura do Pedro Mexia, gostava de me sentar com ele e perguntar-lhe:

Não acha que, aí desde os anos 1990, o capitalismo se tornou tão brutal e selvagem que as pessoas deixaram de confiar que, em caso de doença, seriam devidamente tratadas, que teriam boas escolas para os seus filhos, que eles iriam para a universidade se quisessem, que poderiam sempre pagar a renda da casa, que a sua reforma lhes permitiria viver decentemente e pagar os remédios, e que essa descrença, ou dúvida, torna nas pessoas inseguras, irritadas, extremistas, em suma, sementes de fanatismos?

A temperança no sec XXI é, parece-me, apenas companheira de vida de quem está confortável, como o Pedro Mexia - homem, branco, sem filhos, culto, e com formação que o faz desejado em muitos lugares públicos e privados. Muito semelhante aos meus filhos, aliás. Mas, para os outros, ser “morno” é difícil.

12
Mai21

Lixo, lixo e mais lixo, dentro e fora da Terra.

Maria J. Lourinho

..."Estima-se que existam atualmente cerca de 9300 toneladas de lixo espacial a orbitar a Terra. Segundo a Agência Espacial Europeia (ESA), (...) desde o início da exploração espacial, em 1957, cerca de 6.000 lançamentos espaciais colocaram mais de 26.000 objetos na órbita terrestre. Destes, só cerca de 2.800 estão funcionais, constituindo os restantes detritos espaciais, a maioria dos quais "são fragmentos de cerca de 550 desintegrações, explosões, colisões ou eventos anómalos que originam a fragmentação dos satélites ou de partes dos foguetões”, explica a ESA. Os números são ainda mais impressionados quando se considerarem os detritos mais pequenos, que não podem ser monitorizados: a agência estima que habitem a órbita terrestre 900 mil objetos maiores do que 1 centímetro e 128 milhões com mais do que um milímetro.

É uma “autêntica ‘constelação’ de lixo espacial”, com um grande potencial de destruição, afirma Pedro Mota Machado, investigador do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço da Universidade de Lisboa. Pelo facto de atingirem velocidades que chegam aos 56.000 km/hora, mesmo objetos do tamanho de uma unha podem inutilizar por completo um satélite ou causar danos sérios numa nave espacial, pondo em perigo a segurança dos astronautas. Uma ameaça que ficou evidente há pouco mais de duas semanas, quando os astronautas da missão Crew-2 da Space X, que viajavam em direção à Estação Espacial Internacional (EEI), foram aconselhados a recolocar os seus fatos e a sentarem-se em segurança devido a uma potencial colisão com lixo espacial, que não se confirmou."

...

Excerto de um artigo do Expresso do jornalista Nelson Marques, 10 Maio 2021

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07
Mar21

Leituras V

Maria J. Lourinho
  •  "Exposição de Matisse no Pompidou. Online. Até 15 de Março é necessário chegarmos à nossa própria cadeira. O mundo mudou.
  •  Uma história contada por Pascal Quignard sobre o grande pintor Matisse.
    Matisse nunca interrompia o seu trabalho. Diante do quadro ficava por ali, obcecado. Não recebia ninguém.
    Impossível ser interrompido. Não estou, não posso, não quero. Um quadro era um animal a ser criado e depois acompanhado até ao seu último instante, até ao seu término. Criar, cuidar, fechar; depois virar as costas. Eis o artista e a sua obra. Obsessão.
    Um dia, conta Quignard, em Novembro de 1944, quando Matisse no seu atelier trabalhava numa tela, atacando-a com um amarelo fortíssimo, um sobressalto qualquer surgiu à porta. Foi “o dia em que a sua filha Marguerite regressou da sua deportação”.
    A sua filha Marguerite estava fraca, magra, “quase irreconhecível”. A porta do atelier aberta e Matisse uns segundos a tentar perceber quem era. Era a sua filha, regressara, fraca mas viva. Matisse “correu para ela e abraçou-a”.
    A tela que Matisse estava a pintar ficou atrás dele.
    “É a única pintura de Matisse que permaneceu incompleta”, escreve Quignard, “nunca mais Matisse conseguiu meter-se no interior dessa tela para a continuar”.
  •  As pequenas interrupções do mundo miudinho e a grande interrupção: a filha voltou.
  •  Matisse e as guerras, a política e as grandes cores numa tela.
    Os seus dois filhos, Jean e Pierre, foram alistados na 1ª Guerra. A casa dos pais de Matisse foi destruída por um bombardeamento. As várias gerações atingidas; não há sítio escondido quando os corajosos e o perigo estão em movimento e choque.
    Foi operado ao intestino, em 1941, e teve de ficar no quarto, a recuperar, sempre deitado — durante quase um ano. Desenhava com “um carvão preso à ponta de uma vara de bambu”.
    Há imagens invulgares de Matisse deitado a desenhar na parede com este lápis longo.
    Não perder a mão, o mais antigo conselho dado a desenhadores, pintores, escritores, etc.
    Foi poucos anos mais tarde, então, que a Gestapo prendeu a sua filha, desconfiavam que pertencia à resistência francesa. Terá sido torturada."

Excerto da crónica semanal de Gonçalo M. Tavares na revista do Expresso de 5/3/2021

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