Maria J. Lourinho
O título deste post é, igualmente, o título de um livro do neurocientista português António Damásio.
Apareceu-me como quase todos os outros, isto é, sabe-se lá de que confins da memória.
Certo é que conheci António Damásio, professor. Excelente professor. Que, contudo, não parava para pensar se estaria a abusar da sua posição dominante para achincalhar um aluno (a).
Era, nessa altura, pouco antes do 25 de Abril 1974, médico maçarico no serviço de neurologia do Hospital de Santa Maria. Depois daquela madrugada do dia "inteiro e limpo", logo que pôde, emigrou para os Estados Unidos da América. Sem fonte segura de informação, sempre me pareceu que, querendo uma carreira internacional, não esteve cá para chatices e revoluções. Logo, adeus Portugal.
Por lá ficou, fazendo brilhante carreira de investigador, escrevendo livros aplaudidos pelos seus pares (e também pelos seus "impares") num mimetismo parolo, deslocando-se para receber prémios.
Não lhe retiro nem um grama de mérito profissional, é tudo merecido.
O que nunca percebi, é por que razão Marcelo resolveu convidar para o Conselho de Estado este homem, que vive fora da nossa realidade há 50 anos.
Posso ver qualquer cientista, Damásio incluído, a ocupar lugares em quase todos os domínios da vida dum país, da empresa à escola, do mundo cultural às fundações, do hospital à diplomacia etc, mas não consigo ver alguém que há 50 anos não sofre os nossos dias - com desânimos, frustrações, negas, ou as nossas alegrias, esperanças, e vaidades - a aconselhar o PR sobre como conduzir a política que afetará o colectivo que somos, aqui e agora.
Dito isto, Damásio fez bem em não entregar a sua declaração de bens ao Tribunal Constitucional que parece só enxergar a letra da lei.
O que eu acho que ele não fez bem, foi aceitar um convite para vir opinar sobre momentos cruciais de uma realidade que conhece da longe, de ler, de ouvir dizer e que nunca se lhe inscreveu na pele, como a nós.
Não, quando se sentava no Conselho de Estado, ele não era um de nós.
Este convite e sua aceitação tem a marca da tontice de Marcelo e da vaidade de Damásio.
A burocracia acabou agora com as duas.
A foto é do Sapo