Há dias
Uma mulher acorda cedo, abre a janela e vê um dia cinzento, algum vento, chuvisco, o chão da rua bem olhado, as árvores nuas.
Mapeia o resto do dia e resolve voltar para a cama. Apetece-lhe tapar a cabeça, mas não o faz, talvez porque os arrepios no cabelo já sejam demasiados.
Passado o primeiro embate com este sábado, a mulher resolve levantar-se, calçar uns ténis, vestir um casaco impermeável e sair.
Caminha energicamente à volta de três quarteirões vendo o jardim fechado, as poças de água na calçada, as folhas caídas, as lojas encerradas, as pessoas cinzentas e alquebradas, a fila à porta da farmácia.
De regresso a casa, prega três gritos bem puxados para dentro duma toalha felpuda e, de seguida, deixa correr sobre o corpo a água quente do chuveiro.
Não ficou boa, mas afastou o espantalho depressivo da caldeirada inverno+covid+confinamento.
A receita resulta, é barata e dada de boa vontade, se aproveitar a alguém.